A trajetória de Paulo Mendes da Rocha

 

O Arquiteto

Arquiteto, urbanista e professor, Paulo Archias Mendes da Rocha nasceu em Vitória (Espírito Santo) em 1928. Em 1954, forma-se na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. Filho do engenheiro de portos e vias navegáveis Paulo Menezes Mendes da Rocha, diretor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo – Poli/USP entre 1943 e 1947, tem uma formação familiar ligada à reflexão sobre a relação entre engenharia e natureza. Destaca-se muito cedo, aos 29 anos, ao vencer o concurso para o Ginásio do Clube Atlético Paulistano, 1958, obra que lhe vale o Grande Prêmio Presidência da República na 6ª Bienal Internacional de São Paulo, em 1961. Integra, a partir de então, o grupo que, com a liderança de Vilanova Artigas, constitui a chamada “escola paulista” na arquitetura. Realiza entre 1960 e 1961 projetos de escolas para a rede pública,1 e ingressa como professor na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo – FAU/USP. Datam desse período obras fundamentais, como a sede social do Jockey Club de Goiânia, 1962, o edifício residencial Guaimbê, e a própria residência, 1964, no bairro do Butantã, ambos em São Paulo.


Projeta em 1968, ao lado de Artigas e Fábio Penteado, o Conjunto Habitacional Zezinho Magalhães Prado – Parque Cecap, em Guarulhos, para 50 mil moradores. Em 1969, após o Ato Institucional nº 5 – AI-5, é afastado da FAU/USP, à qual retorna apenas com a anistia, em 1980, como auxiliar de ensino – condição na qual permanece até tornar-se professor titular em 1998, quando é aposentado compulsoriamente, por ter completado 70 anos de idade. Com os direitos profissionais cassados, vence, em 1969, em situação paradoxal, o concurso nacional para o Pavilhão do Brasil na Expo’70, em Osaka: uma grande cobertura de concreto e vidro apoiada em colinas artificiais. No concurso internacional para o Centre Georges Pompidou (Beaubourg), em Paris, em 1971, seu projeto é um dos premiados.

Atuante também no campo da representação de classe, preside o departamento paulista do Instituto dos Arquitetos do Brasil – IAB/SP em duas ocasiões: 1972-1973 e 1986-1987. Entre 1987 e 1988, seus projetos para a Loja Forma e para o Museu Brasileiro da Escultura – MuBE, este também vencedor de um concurso, inauguram uma nova fase de reconhecimento público do seu trabalho. Seguem-se a esses os projetos para o pórtico da Praça do Patriarca, 1992, em São Paulo, a reforma da Pinacoteca do Estado de São Paulo – Pesp, 1993, e o Centro Cultural da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – Fiesp, 1996.

Em 1996, as editoras Blau, de Portugal, e Gustavo Gilli, da Espanha, lançam, em co-edição, o livro Mendes da Rocha. Seu reconhecimento internacional se intensifica com a Sala Especial Mendes da Rocha na 10ª Documenta de Kassel, na Alemanha, 1997, e com o Prêmio Mies van der Rohe de Arquitetura Latino-Americana, em 2000, pela reforma da Pesp. Com a publicação do livro Paulo Mendes Da Rocha: Bauten Und Projekte, na Europa pela Niggli Verlag, em 2001, e encomendas de projetos na Espanha, recebe o importante Prêmio Pritzker, de 2006, condecoração máxima entre os arquitetos no mundo.


Obras

Loja Forma, 1987

O programa consistia na criação de um espaço para exposição e venda de móveis. E não qualquer tipo de móveis, mas coleções assinadas pelos principais arquitetos e designers do século 20. Além disso, o terreno apresentava como característica importante o fato de estar numa avenida predominantemente ocupada por estabelecimentos comerciais, com um tráfego intenso e rápido de veículos, o que eliminava a possibilidade de que os clientes estacionassem junto às calçadas, e diminuía consideravelmente a probabilidade de que chegassem à loja a pé. 


Por um lado, a forma prismática elementar, que dá ao edifício grande intensidade formal e lhe confere destaque por contraste em meio ao caos visual que caracteriza a avenida Cidade Jardim. Um edifício mais elaborado formalmente se confundiria facilmente com os seus vizinhos, impedindo a sua identificação imediata.

Por outro lado, a decisão de criar uma única vitrine, elevada em relação à rua, garante visibilidade aos objetos à venda do ponto de vista habitual de quem passa pela loja, quase invariavelmente dentro de um carro e trafegando à velocidade considerável.

O problema do estacionamento para clientes se resolveu dedicando todo o nível do solo a essa atividade (750 m²). Para que isso fosse possível, o piso da loja foi elevado. A eliminação de qualquer apoio intermediário acrescentou ainda mais facilidade ao ato de manobrar um automóvel sob o edifício. O fato de que a entrada da loja se dê por uma escada retrátil é mais um recurso para a liberação completa do térreo.

Tanto o desejo de contar com um pavimento térreo livre como o de criar uma longa vitrine sem nenhum apoio intermediário tiveram importantes consequências técnicas.

É neste momento em que começa a aparecer a maestria do arquiteto, pois forma e construção são resolvidas ao mesmo tempo, chegando a resultados de rara consistência. Ao contrário da maioria dos edifícios com que convivemos, aqui estrutura e forma se confundem a tal ponto que fica difícil definir qual é qual. Como em muitos outros casos na arquitetura de Paulo Mendes da Rocha, após a definição e/ou construção da estrutura resistente pouco falta para completar o edifício.





Para vencer trinta metros de vão livre, são necessários vigas e pilares de tamanho considerável. O que é digno de menção é o fato de que embora essas vigas e pilares sejam enormes, não nos damos conta dessas dimensões, devido à sua integração com outros elementos do projeto. Duas vigas protendidas “duplo T” de concreto de aproximadamente um metro e meio de altura vencem o grande vão ao nível do piso da loja. Essa dimensão passa despercebida pelo fato de as duas vigas fazerem parte de um elemento maior que define, ao mesmo tempo, o teto do estacionamento, o piso da vitrine e o piso do nível principal da loja. Esse entrepiso é resultado da extensão das mesas das vigas, constituindo duas lajes. A laje superior conecta as duas vigas sem ultrapassá-las e constitui o piso da loja. A laje inferior, protendida no sentido transversal, avança até os limites da caixa e constitui o piso da vitrine. Essa diferença de nível entre as lajes, além de individualizar a vitrine como um espaço, permite uma visão ascendente e diagonal do interior da loja desde o seu exterior e no sentido inverso. Uma brilhante solução que resolve espaço e estrutura ao mesmo tempo, sem nunca cair na tentação de exibir a “musculatura” do edifício.




Coisa similar acontece com os apoios verticais, quatro pilares retangulares com lados medindo aproximadamente 1,3m. Os pilares são unidos, dois a dois, por lâminas verticais de concreto que dão rigidez ao conjunto e cujas extensão é maior do que a distância entre pilares. Isso acaba tendo efeito semelhante ao que se viu em relação às vigas de concreto protendido: os planos de concreto escondem a real dimensão dos pilares e, pelo avanço da lâmina externa até o limite da caixa, sugerem que o volume é suportado por um plano quase sem espessura. No interior de cada conjunto de dois pilares e dois planos esbeltos –que no jargão local são chamados de “castelos” – estão dispostas as instalações, a escada, elevador, sanitário e demais apoios.




Uma primeira descoberta é que praticamente a mesma solução é empregada no sentido vertical e no horizontal, configurando um sistema estrutural principal com a forma de uma grande letra “H”. Sobre esse H em concreto, formado pelos dois conjuntos verticais e o conjunto de vigas e lajes que formam o piso principal da loja, se assentam os outros elementos do edifício, ambíguos em seu duplo papel de estrutura e fechamento. Resistindo à tentação de reproduzir o sistema empregado no piso da loja na cobertura, Paulo Mendes da Rocha opta por um sistema de estrutura metálica para a cobertura e as fachadas.


Vigas metálicas de trinta metros de extensão e aproximadamente sete metros de altura constituem as fachadas principal e traseira, resolvendo desse modo a longa e contínua vitrine, que se caracteriza como um intervalo entre viga superior e laje inferior, uma ausência de elementos que, paradoxalmente, adquire um protagonismo essencial. Unindo as duas vigas principais aparecem a estrutura da cobertura e o mezanino da loja, o qual aumenta a área de loja ao mesmo tempo em que atua como contraventamento de todo o sistema metálico. Fica assim definido um grande prisma de espaço interior, cuja unidade o mezanino não compromete, absolutamente adequado ao seu propósito de expor móveis contemporâneos.


A precisão está presente em todos os recantos da Loja Forma, tanto no modo em que os elementos são projetados, na coordenação entre eles, assim como nas suas junções e terminações. A universalidade da solução reside não apenas na possibilidade de ser entendida por qualquer pessoa com um mínimo de formação, mas também no fato de que, embora seja uma resposta a um problema específico, podemos imaginar esse edifício abrigando atividades diferentes do atual. A ausência de pilares e instalações visíveis no exterior do grande prisma de espaço aumenta suas possibilidades de usos diferenciados.

O projeto da Loja Forma evidencia que, quando se trata de obras de arquitetura de qualidade superior, a forma não é um componente a mais, mas o modo em que o programa, a técnica e o lugar são sintetizados. E que, fundamentalmente, a arquitetura de excelência não depende, para o seu surgimento, de localizações espetaculares, orçamentos ilimitados ou programas extensos e glamurosos.


Museu Brasileiro da Escultura – MuBE, 1995

O Museu Brasileiro da Escultura Marilisa Rathsan (Mube) é o resultado da mobilização dos moradores de um dos bairros mais nobres de São Paulo contra a construção de um Shopping Center. Liderados pela criadora, fundadora e presidente da Sociedade Amigos do Museu (SAM), Marilisa Rathsan, após 20 anos a Prefeitura cedeu em comodato a construção de um museu. Localizado em uma zona residencial da cidade de São Paulo, o MUBE foi inicialmente projetado para ser um museu de escultura e ecologia, compondo espelhos d’agua, arvoredos, bromélias, flores nativas, projetado pelo paisagista Roberto Burle Marx. Entretanto, foi realizado para ser apenas o museu da escultura. O edifício principal não é aparente a céu aberto, a não ser pelo alpendre, grande prisma reto, lugar de abrigo, coberto por uma viga de concreto protendida de 12 m de largura, vence um vão livre de 60m. O museu tem sua configuração em diferentes níveis devido a topografia original, aproveitando essas diferenças de altura para integrar os espaços externos com os internos. Seu interior é composto por salas de exposição amplas, um auditório, salas de aula e uma cafeteria.


Instalações

O Museu tem em suas instalações Sala de exposições, aulas de arte e Auditório. Recebe exposições itinerantes nacionais e internacionais com área de aproximadamente 1.400 m2. Os Ateliês Oficinas com 600 alunos contam com cursos e workshops mestrados por ótimos profissionais artistas plástico, críticos e historiadores de arte. O auditório tem capacidade para 200 lugares sempre realizando mostras, filmes, slides, dança, debates, congressos e etc. Sempre trazendo cultura em diferentes mídias.

 

Projeto

A representação da ecologia pelo jardim de Burle Marx não seria apenas um jardim do Museu, mas parte integrante da área de exposições ao ar livre idealizado pelo Arquiteto Paulo Mendes da Rocha pelo simples fato do jardim ser o Museu. Para não se tornar uma construção convencional com recuos laterais, frente e fundos e analisando as condições topográficas do terreno, o Arquiteto definiu um Museu semi-subterrâneo aproveitando o desnível e a construção aflora na entrada pela Rua Alemanha. Essa solução auxilia a acústica e térmica da área enterrada. A solução para a proteção da área externa foi uma grande e perfeita horizontal, perpendicular a avenida Europa. A altura tem referências á escala das esculturas e escala humana de 2,30m.

  

“... um horizontal perfeito é um valor arquitetônico e técnico incomensurável que pouco se dá atenção. Não existe nada horizontal no universo, na face do planeta.”

Paulo Mendes da Rocha, 2002








Situado na zona residencial da cidade, o MuBE foi inicialmente imaginado como um museu de escultura e ecologia. Assim decidiu-se que seu destino seria abrigar uma “notícia da paisagem”. Realizado apenas como museu da escultura, ele não deixou de ser imaginado como um jardim, como uma sombra e um teatro ao ar livre. A edificação principal não é aparente a céu aberto, a não ser por um alpendre, grande prisma reto, lugar de abrigo simbólico sobre o jardim, ponto de referência e parâmetro de escala entre as esculturas e o observador.



Entre as formas de pensar o espaço, há aquelas que procede das ideias aos fenômenos, das medidas a construção. Há uma outra que parte de uma situação originária para desdobrar novas configurações. A primeira necessita apenas de cálculos e razão e a segunda de uma imaginação do espaço. Pode-se considerar que o Projeto de Paulo Mendes da Rocha sugere um raciocínio espacial e topológico, ao mesmo tempo.

De início parece claro que a inteligência do projeto é ter tomado o lote por inteiro, como seu campo de intervenção. A aparente distorção da planta, com seus ângulos agudos e deslocamentos de eixos, se mostra, na verdade, de uma singeleza desconcertante. A planta é o rebatimento quase em escala natural do perímetro do lote, que só então reconhecemos com sua geometria deformada.



Da mesma maneira, os cortes e elevações tornam evidente a situação original do terreno: os desníveis se sucedem da Avenida Europa até a Rua Alemanha e, daí até o interior do museu, na profundidade permitida pelo lençol freático, por esses desníveis, o espaço interno aflora, surpreendentemente visível, no piso superior, sob a forma de uma praça recortada, um anfiteatro e um espelho d’água.


É o corte, portanto que induz a um percurso ininterrupto do interior ao exterior e vice-versa, numa clara demonstração da ideia de espaço contínuo.

Se o corte é o rebatimento do terreno e se a planta é o rebatimento do lote, o resultado dessa equação retirou o lote de sua condição de mero recorte no mapa urbano, ao lhe restituir o corpo e a fisicalidade do terreno. Só então se compreende que a extensa viga que atravessa, solta, todo o projeto, rigorosamente sem função estrutural, sustenta na verdade o que está em baixo, a superfície construída, e a mantém numa calma tensão, entre a memória plana do antigo terreno e a sua reconstituição como novo lugar. Essa grande viga foi criada, pois a intenção do arquiteto era colocar uma pedra no céu, assim como as pedras de Estonehenge.


Ao nível da grande praça, a extensa linha da laje (60mx20m), muito baixa como que comprime sob ela o seu negativo, uma faixa vazia. A proporção quase 1:1 entre a altura da viga e o pé direito (2m x 2,5m) produz, assim, uma espécie de compressão do olhar em direção ao piso, que nos leva a descer, pouco a pouco, até o interior do museu. Percebe-se nesse momento que a dimensão do grande pilar (4mx12m) faz dessa marquise a medida horizontal e vertical do terreno, ou seja, uma coordenada cartesiana. É por isso que não se pode entendê-la simplesmente com um objeto dentro do lote, mas como a medida e a escala visual de todo projeto. É um marco, não um monumento.

O projeto destrói, assim, a primeira impressão, a de uma superfície estática sobre a qual um objeto vem pousar.

Na cota mais baixa do terreno, a praça de entrada revestida com um mosaico branco é uma mancha clara a dissolver a gravidade da massa de concreto que desce verticalmente sobre ela. De seu lado, na cota mais alta, a lâmina d’água no ângulo extremo do lote não espelha nada, é antes uma reverberação de luz parece agora vir de baixo para cima, como a recortar um vazio no piso da praça superior. Vista da esquina, ao nível da rua, dela somente resta uma pequena luminosidade sobre a empena opaca do concreto, uma imagem fluida da memória horizontal do terreno. A antiga superfície está assim presente e ausente ao mesmo tempo.



Paulo Mendes da Rocha impressiona com o projeto deste museu, pois existe um controle do partido muito grande, e a determinação em implantar o projeto sobre si mesmo. É uma situação que faz criar um lugar, uma marca na cidade.

Neste em um sentido próximo a “pedra bruta” de Corbusier, como índice da matéria anterior à transformação operada pelo trabalho e pela sociabilidade. A disponibilidade da “pedra bruta” e a técnica são o que permite ao arquiteto colocar de maneira sutil, a passagem da natureza à cultura, da superfície a construção.   

 

Concepção e Análise Estrutural 

Como mencionado anteriormente, o arquiteto Paulo Mendes da Rocha pretendia “colocar uma pedra no céu”. A maior barreira a ser vencida era a escala, o grande vão de 60 metros, e para isso, foram necessários três requisitos: maior leveza e resistência da estrutura e evitar a deformação da peça.



Para obter maior leveza, na seção transversal foi utilizada uma estrutura alveolar, com paredes delgadas, resultado das nervuras da laje do tipo caixão perdido e na seção longitudinal foram utilizadas vigas do tipo vierendeel, mais leves e tão eficientes quanto a de alma cheia.

 Para obtenção de maior resistência, foram utilizados materiais de alta tecnologia, como o concreto de alta resistência. Normalmente são utilizados concretos com fck 150 ou 180 Kgf/m2, porém nesta obra foi utilizado com fck 350 Kgf/m2. O mesmo ocorreu com o aço escolhido, onde normalmente se usa o CA 50, que resiste a 5000 Kgf/m2, foi usado o CP 190, que resiste a 19000 Kgf/m2, ou seja, quase quatro vezes mais resistente do o utilizado em estruturas convencionais.

Vencidos esses dois problemas, ainda restava evitar a deformação da estrutura, que com o peso e o tempo seriam acentuadas. Para isso foi utilizada a técnica da protensão, com introdução de cabos de aço, produzindo forças de baixo para cima, ou seja, opostas a da gravidade. Com isso, criou-se uma contra flecha de 15 cm, calculada para que nunca seja absorvida totalmente. Outros ajustes foram feitos no projeto de acordo com a estrutura, como a altura dessa viga, que inicialmente seria de 2 metros, porém seria necessária a utilização de um concreto muito mais resistente, passando para 2,5 metros de altura.

Com o problema das deformações verticais resolvido, passou-se para as deformações horizontais sofridas pelo concreto e pelo aço, devido a variações térmicas, protensão e variação volumétrica (retração do concreto na secagem), que pode chegar a 2 ou 3 cm.

Para absorver essas variações, as vigas foram articuladas aos pilares por quatro apoios, sendo no pilar menor (mais curto) quatro articulações fixas, e no pilar maior (mais longo), quatro articulações móveis, permitindo essas movimentações horizontais, utilizando uma camada de neoprene de 5cm de espessura.

 

A durabilidade desses materiais deve ser assegurada por algumas medidas, como a proteção das armaduras e cabos de protensão do concreto, que necessitam de um recobrimento adequado para evitar a corrosão. O neoprene, feito de borracha sintética, está mais sujeito ao envelhecimento e ressecamento devido a ações do tempo e, por isso, deve ser trocado a cada 10 ou 15 anos. Prevendo isso, foi deixada uma fenda de 15 cm entre as vigas e o pilar, suficiente para a colocação de três macacos hidráulicos, suspendendo a viga, para substituição do neoprene.



O museu em si é, em sua maior parte, subterrâneo, sendo necessário um sistema de drenagem muito eficiente ao longo de toda sua extensão, pois o lençol freático existente fica numa cota acima do nível da construção. As paredes são continuamente estruturais, de concreto armado, que já servem como pilares e muros de arrimo, e muito bem impermeabilizadas, por estarem em contato direto com a água.



As lajes são protendidas e nervuradas a cada 2,45 metros, ao longo dos três blocos de 18 metros cada, e tem espessura de 10 cm, apoiando-se nas paredes estruturais. Somente na parte do auditório as nervuras seguem a curvatura dos pisos deste.



Essas lajes possuem uma contra flecha exagerada, para que haja escoamento das águas pluviais, já que o piso da praça acima é falso. Foram utilizados estrados pré-moldados e grelhas, permeáveis, para que a água penetre, escorra sobre a laje e chegue até as paredes estruturais, que possuem calhas de escoamento.

Neste projeto é claro percebemos que a concepção estrutural nasce junto com a concepção arquitetônica, já que a estrutura é a própria arquitetura.

É importante enfatizar que para o desenvolvimento de 1 projeto como este é indispensável essa ligação.

Paulo Mendes da Rocha teve a intenção em seu partido de criar um marco na cidade, porém respeitando o partido do bairro, perde a escala urbana. Já para o visitante, esse conceito de monumentalidade torna –se evidente.

Pelo declive do terreno e a vontade do arquiteto de utilizar o subsolo, a solução usada com paredes estruturais e muros de arrimo, foi a mais adequada, permitindo grandes vãos livres nas áreas de exposição.

Em relação a “pedra no céu” (grande viga), não corresponde a uma inovação estrutural, já que foi utilizado o concreto de vigas simplesmente apoiadas em pilares. Porém, a dificuldade de vencer o grande vão foi superada pela utilização da viga Verendel e da contra flecha de 15 cm. Soluções interessantes foram utilizadas com relação à movimentação horizontal, como as peças de Neoprene.

O arquiteto deu muito mais importância à estética e mantendo – se fiel a sua primeira ideia, colocando em segundo plano a quantidade de concreto exagerado, a dificuldade e o longa tempo de execução da obra.    

 

Cobertura Praça do Patriarca, 2002

A nova cobertura para o acesso à galeria Prestes Maia, agora Masp-Centro, mal foi inaugurada, e já tem gerado muitos comentários. Tanto porque situa-se em um dos locais de maior fluxo da cidade – a praça do Patriarca, ponto de chegada do viaduto do Chá –, como pelo fato de ser a construção mais recente do arquiteto Paulo Mendes da Rocha.





Mas no que consiste a intervenção? Por um lado, na restauração da praça, que havia sido convertida em terminal de ônibus. Por outro, na sua transformação em um espaço novo: a obra tem despertado a curiosidade dos passantes devido à sua formalização “sui generis”, que excede a simples função de uma cobertura. Além disso, instalou no centro da cidade um canteiro de obras inusual, quase naval, com grandes perfis metálicos pré-fabricados, chapas curvas e máquinas de solda.

Ao lado dessa inquietação, a obra tem provocado também uma certa rejeição, dada a radicalidade com que se expõe e intervém no espaço urbano. Nostálgicos da cidade do século 19 ficaram insultados com o que parece ser uma intromissão na escala da praça. Ou, ainda, com a heresia de aparentemente ter-se obstruído a visão da igreja de Santo Antônio, que ali se encontra. Ora, sabemos que a particularidade de São Paulo, tanto na beleza quanto na feiura, está na sua capacidade de se transformar. Característica que faz com que posturas exageradamente preservacionistas, que só se justificariam caso a praça ou suas edificações fossem exemplares significativos da nossa arquitetura, representem, ao fim, não mais do que questões deslocadas.




Neste projeto, não há lugar para um certo bom gosto de juízo ponderado, que prefere aplaudir o que entende como uma transgressão contida, conseguida por Mendes da Rocha no edifício da Pinacoteca do Estado, onde as “interferências” metálicas dialogam mais de perto com os elementos antigos. No pórtico da Praça Patriarca não há meio termo, ele é indesculpavelmente acintoso.

A ideia de que o pórtico encoste demais nas edificações vizinhas, possuindo proporções exageradas, também é um falso problema. Pois, se os pilares estivessem mais próximos à cobertura, ambos seriam percebidos como um objeto único, que se assenta sobre o terreno. No entanto, trata-se do contrário. O conjunto é uma realização espacial que ultrapassa a objetualidade autossuficiente e a escala da praça isolada. Percebido como uma sucessão de planos interrompidos que emolduram a paisagem da cidade de diferentes modos – estáveis e instáveis –, o conjunto viga-pilar-marquise implanta-se como se quisesse atravessar os edifícios laterais, indicando um sentido ilimitado de passagem, como a direção transversal da rua São Bento, que corta a praça ligando a igreja de mesmo nome à de São Francisco.


 



Realizando uma leitura da cidade, o projeto é um inteligente comentário sobre o desejo de não confinamento dos seus espaços, definindo, ao mesmo tempo, na escala local, uma praça aberta que pode ser lida como um átrio para a igreja. Essa anti-objetualidade expansiva de uma arquitetura que passa a dar sentido, por contraste, ao entorno, pode ser melhor compreendida se comparada à pirâmide do Louvre, que também protege o acesso a uma entrada subterrânea de museu, mas configura-se como um objeto ensimesmado (note-se também que o sentido de uma sombra ao ar livre revela o caráter tropical do projeto).Outra implicação fundamental do pórtico, que complementa as anteriores, é o seu caráter de medida. Como uma régua horizontal, dá parâmetros para a percepção da topografia da cidade, feita de vales e colinas, demonstração eloquente do cenário em que esta surgiu. Assim, o poder de irônica suspensão de sua cobertura está ligado ao fato de permitir o livre fluxo urbano, pela comunicação com um plano mais baixo, que é o vale do Anhangabaú. Razão pela qual é fundamental que o acesso inferior à galeria nunca seja bloqueado, pois a qualidade de passagem é o que garante ao projeto sua inserção urbana, e em grande medida ampara o seu sentido espacial.




Reforma da Pinacoteca

Construído na última década do século dezenove para abrigar o Liceu de Artes e Ofícios nunca foi totalmente concluído. Já em Novembro de 1905 foram executadas as primeiras obras de adaptação, ainda sob o plano e direção do arquiteto Ramos de Azevedo, para receber a primeira coleção de quadros pertencentes ao Estado e que passaram a constituir a Pinacoteca.

De lá para cá, o edifício passou a receber diversos tipos de ocupação e toda a sorte de absurdas agressões e abandono, desde a inclusão de piso intermediário numa ala inteira, para abrigar uma escola com milhares de alunos, até as transformações, inevitáveis, dos arredores, desengonçando sua implantação, quando deveriam manter-se cuidadosas com a sua arquitetura peculiar. O prédio em si também sofreu estragos, consequência das águas, do estado dos telhados, goteiras e entupimentos das prumadas de águas pluviais, principalmente.



A América das navegações, encontrada como comprovação da forma da Terra, surge, para o homem, como a inauguração da consciência de sua presença no universo e da esperança na invenção e na transformação promovidas pela modernidade. No trabalho do edifício da Pinacoteca, duas operações marcam, de maneira fundamental, sua transformação. Em um primeiro momento, a rotação do eixo principal de visitação, lograda graças à manobra sutil de cruzar, com pontes, os espaços vazios dos pátios internos, que altera a implantação do edifício e sua relação com a cidade. Esta manobra, no interior do edifício, exibe a virtude da arquitetura em sua extensão ao espaço urbano, seu poder de narração — linguagem peculiar de uma forma de conhecimento histórico do gênero humano. Experiência.



A primeira etapa dos trabalhos foi um levantamento geral, com detalhes, da construção no estado em que estava e o estabelecimento de um programa funcional. Foi desenhado um estudo básico, uma proposta íntegra, anteprojeto, que foi aprovado pelos órgãos competentes.


O objetivo primordial da obra foi a adequação do edifício às necessidades técnicas e funcionais para receber definitivamente a Pinacoteca do Estado, cujo perfil funcional estava perfeitamente delineado pela sua localização urbanística, pelos espaços internos, pelo público potencial e pela ideia de ampliação do acervo, recepção de exposições temporárias e dotação do prédio de toda a infraestrutura necessária.

O projeto procurou resolver os problemas detectados no diagnóstico do prédio: a umidade que paulatinamente degradava as robustas paredes em alvenaria de tijolos de barro; a complicada distribuição das áreas de exposições espalhadas por inúmeras salas e estruturada a partir dos vazios internos conformados por uma rotunda central em forma octogonal e dois pátios laterais e, ainda, o plano de acesso, comprometido pelas transformações urbanas ocorridas nas áreas entorno do edifício.


Os vazios internos foram cobertos por claraboias planas, confeccionadas em perfis de aço e vidros laminados. Evitou-se a entrada de chuva e garantiu-se, através da ventilação, a reprodução das condições originais de respiração do conjunto dos salões internos. Ao mesmo tempo, possibilitou uma nova utilização desses espaços: no nível do chão, salões de pé direito triplo, que possibilitam uma nova articulação entre todas as funções, liberta da rígida planta original; nos pisos superiores foram instaladas passarelas metálicas vencendo os vazios dos pátios laterais;  no vazio central, foi construído o auditório, cuja cobertura, no primeiro pavimento, transformou-se num saguão monumental que articula, em conjunto com as passarelas, praticamente sem barreiras, através dos eixos longitudinal e transversal do edifício, todos os seus espaços. Em um pátio lateral foi instalado um grande elevador para o público e montagens.                


















As esquadrias das janelas das fachadas internas puderam ser retiradas e mantidos seus vãos abertos, gerando uma grande transparência e destacando as grossas paredes autoportantes de alvenaria de tijolos.

Criou-se, dessa forma, uma nova espacialidade em todo o recinto da Pinacoteca: na sucessão dos espaços, no fluxo dos visitantes, na luminosidade, produzida ou reproduzida com os recursos arquitetônicos projetados.


 Com a viabilização da nova circulação pelo eixo longitudinal do edifício, interligando as duas varandas laterais, e devido ao fato de estar o prédio numa esquina, a entrada do museu foi transferida para a frente da Praça da Luz, na face sul, modificando-se a sua implantação com relação à cidade. Ressalta-se a utilidade importante do uso das varandas como espaços de acolhimento, uma área vestibular ainda externa, mas abrigada e equipada com serviços ao público. Também foi corrigido, dessa forma, o inconveniente estrangulamento entre o prédio e a Avenida Tiradentes. O acesso, agora possível a partir de um amplo recuo com relação a Praça da Luz, espaço externo largo e contínuo, estabelece um diálogo interessante com o belo edifício da Estação da Luz e a animação proporcionada pelo metrô e pelo Parque ao lado.


Ao realizar um novo eixo de circulação e modificar o acesso, o projeto criou um terraço / belvedere no local da antiga entrada, área de estar externa e aberta que possibilita a vista da paisagem urbana próxima.




A construção original foi essencialmente mantida como encontrada, conservadas, inclusive, as marcas dos antigos andaimes e as das ocupações e intervenções anteriores. Todas as intervenções propostas pelo projeto foram justapostas e tornadas evidentes.

As fachadas externas foram preservadas como se mantiveram nestes 100 anos de existência do edifício. A sua alvenaria de tijolos aparentes é uma imagem forte e marcada na cidade. A solução foi limpar e neutralizar agentes agressivos acumulados pela poluição, manter os incontáveis meandros dos ornamentos esculpidos nos tijolos, muito desgastados, e proteger quimicamente de forma adequada, conservando a cor e textura.

 Quanto aos materiais utilizados, o aço foi o principal material construtivo adotado. Está presente nas passarelas, nos elevadores, nos parapeitos, nas novas escadas, nas estruturas dos novos pisos e coberturas, nas esquadrias e nos forros. Seu uso foi devido a sua melhor adequação às condições locais de execução, sua leveza (material e desenho) e por estabelecer um diálogo interessante e desejável com a construção original, entre o novo e o antigo.



Complementando a adequação do edifício às condições técnicas e de infraestrutura necessárias no desempenho adequado da função museológica, foram executadas algumas obras prioritárias: o reforço estrutural dos pisos originais de madeira através de vigamento; complementar com perfis de aço; sistema de climatização nas áreas das Exposições Temporárias, Depósito do Acervo, Auditório, Laboratório de Restauro; elevadores para montagens e público; sistema de controle e segurança; sinalização; rede elétrica com adequada capacidade de carga; ampliações das áreas do Depósito do Acervo, Laboratório de Restauro e Biblioteca; criação do Café e Restaurante.


Casa Gerassi

A Casa Gerassi foi concebida para romper dois prejuízos da construção pré-fabricada: um, que é para pobres, porque padroniza, congela e limita; e, dois, que é para grandes construções, como estádios e pontes, porque leva implícito grandes vãos e eficiência construtiva.


Para uma casa de um casal de classe média alta e duas filhas, utilizar uma estrutura pré-fabricada de concreto armado e protendido era pouco levado em consideração, tanto pelos arquitetos como pelos clientes. No entanto, aliado ao fator cliente = engenheiro, e consequentemente a um discurso orçamentário, prático e ágil, o projeto foi logo aprovado.


A casa se desenvolve num pavimento superior. O nível térreo é livre, uma grande área de lazer, com somente os volumes da escada e de apoio à piscina interrompendo a total abertura dessa área. Posteriormente, outro volume de paredes diagonais em cor laranja foi adicionado.



Está estruturada em seis pilares de seção quadrada dispostos nas laterais do edifício. Conformando o piso do pavimento principal da casa, três vigas transversais unem em pares os pilares, que já levam moldado consigo os apoios para elas. Outras três vigas, acima e alinhada às primeiras, estruturam a laje de cobertura. Lateralmente, outras oito vigas unem em pares as extremidades das demais vigas. Os pilares ficam, assim, visualmente destacados do volume do edifício. Foram preciso apenas dois dias e meio para a montagem dessa estrutura principal.



Um dos pilares das esquinas posteriores da casa eleva-se para receber um volume cúbico da caixa d’água.


Distributivamente, a casa se desenvolve ao redor de uma claraboia quadrada e seu respectivo ralo, disposto sem maiores preocupações como um gradil horizontal ao meio do salão de estar e jantar, que entra em consonância com a singeleza dos ladrilhos hidráulicos que compõe o piso.



Não há corredores. Os três dormitórios em suítes têm suas portas diretamente a esse salão. Enquanto este tem suas vistas a nordeste, os dormitórios dão para sudoeste. A cozinha e área de serviço é lateral ao salão principal, separada deste pela escada, também iluminada zenitalmente. O programa e a distribuição funcional, da mesma forma que a estrutura da casa, é muito simples.